PASSOS LARGOS
“Ouvindo o instigante trabalho de Samuel Pompeo, fui transportado para um lugar inusitado e cheio de boas surpresas. Onde, a "Passos Largos", ele nos conduz a um passeio por diversos estilos e os transforma numa música única, de execução impecável, com arranjos e composições primorosos. Samuel traz à tona o saxofone barítono no papel de solista, com fluência e sonoridade realmente fora de série. Revela também exuberância nas melodias e solos de clarone e sax-soprano. Os músicos que o acompanham merecem destaque, por sua sonoridade, seus improvisos e virtuosismo do mais alto gabarito. Me chama muito a atenção as melodias, às vezes dobradas; as harmonias, com suas modulações; os contrapontos entre os integrantes, “perguntas” e “respostas” de uma conversa belíssima; e, sobretudo, o ritmo, com transições de execução complicadíssima, mas soando muito naturalmente, entre jazz, choro, samba, tango brasileiro, entre vários outros ritmos e estilos. É como se John Coltrane e seu grupo tivessem um encontro com Pixinguinha, Radamés Gnattali e até mesmo Ernesto Nazareth. Os arranjos são rebuscados, passando a sensação do cuidado em cada detalhe, cada frase, cada modulação. Isso tudo sem esquecer da qualidade das composições, que vão de Radamés Gnattali, Pixinguinha, Benedito Lacerda, Laurent Hess, João Cristal e do próprio Samuel. Outro ponto relevante é a qualidade sonora do projeto. Bem mixado. Bem gravado. Tudo está no lugar, por mérito dos engenheiros de gravação e mixagem e também pelo comprometimento e qualidade dos músicos envolvidos. A guitarra, em convivência hiper harmônica com o piano (só quem toca sabe da dificuldade), a solidez do contrabaixo que, elegantemente, nos conduz a esse ballet harmônico e rítmico. A bateria, que com muita criatividade e precisão propõe as transições rítmicas do jazz, do samba, do maxixe, do choro, do afrojazz! Tudo isso "costurado" pela sonoridade do Samuel Pompeo, que consegue trazer docilidade, suavidade, pressão e virtuosismo numa performance única. Afinadíssima e inspiradíssima. Alguns destaques: o começo livre, com intervalos instigantes, e a polirritmia da faixa “Dodecafonando”; a mistura de um “Tango Brasileiro” a la Ernesto Nazareth com o Jazz, na música “Cliff Cliff”; o lirismo de “Valsa Triste”, com o tema apresentado nos graves do sax-barítono e do contrabaixo; a complexidade aliada à delicadeza na faixa “Pé de Moleque”; e, encerrando o álbum, a “Naquele Tempo” traz uma linda conversa, cheia de transições rítmicas, e os belíssimos improvisos de Piano, Guitarra e Soprano. Passos Largos é, definitivamente, uma celebração entre o choro e o jazz, com pitadas de música erudita, num passeio sonoro necessário para estes nossos tempos desafiadores.
Viva a música brasileira! Viva os músicos brasileiros!"
Otavio de Moraes